Enquanto isso na selva...

Eis que surge o sistema simpático. Eu sempre achei graça desse nome. Imagino, séculos atrás, fisiologistas a todo vapor descobrindo coisas que hoje sabemos desde a oitava série. Um mostra pro outro alguns papéis com anotações explicando o achado e diz: aqui, são os efeitos dessa substância: acelera o coração, dilata a pupila e promove ejaculação... Um outro observa e diz, "nossa, que simpático! já tem nome esse sistema?".

Sistema simpático. Muito bem. Quando você procura as bases do sistema nervoso periférico, todo professor explica e todo mundo entende que o sistema simpático serve, em qualquer bicho, para ativar o 'estado de fuga'. Essa descrição até ajuda no raciocício lógico pra adivinhar como ele modifica o corpo, preparando o organismo, fornecendo energia e habilidades para se ter artifícios extras diante situações de stresse. Situações em que você tem que correr, lutar, fugir, evitar acidentes, salvar alguém, dar o dinheiro ao assaltante e desviar de barbeiros no trânsito.

O sistema simpático é amigo. Nos 'dá força não sei de onde'. É legal, sentir o susto, o nervoso do amado chegando, ansiedade de receber um resultado, tudo isso nosso corpo se preparando. Nossas reserva, é reserva mesmo, tipo ser banco no futebol, ter poupança, caixa dágua, dispensa. São reservas, você as tem para situações extras, extraordinárias, excepcionais, tensas, avulsas, esporádicas, inesperadas, idiopáticas e assim vai.

O que acontece que é que na selva os bichos vivem nessa dinâmica de relax e cuidado com situações adversas. hora ou outra vem um trovão, um coco que cai na cabeça, um predador, ou qualquer coisa assim que os fazem usar essa habilidade de mudar seu corpo pra atuar em situações de stresse. ah, o stresse. sinceramente, deveria esse entrar como critério da síndrome metabólica: hipertensão, diabetes, obesidade, dislipidemia e stresse.

Nessa selva aqui, os trovões, cocos e predadores, estão pela rua e em nossa casa todo dia. todos os dias. todo santo dia. desde que deixamos de ser bandos e passamos a viver em aglomerados, surgiram os vizinhos, carros, chefes, emails, multas, consertos, e bilhões de coisas pra resolver. todo dia. e nosso simpático sistema fica o tempo todo tentando nos adaptar ao stresse. nosso corpo todo recebendo aquelas informações de alerta. todo dia. corra, lute, fuja, se salve, pague imposto, não esqueça, não se atrase, não, não, não. todo dia.

Assim, toda essa simpatia de adaptação para o stress que sempre ajudou os bichos a sobreviverem, quando afogada no exagero, nós faz responder detalhes que são intrínsecos da vida moderna com stress alto, e muito pelo contrário, ao invés de sobreviver na selva, faz todo mundo ir se matando aos pouquinhos. todo dia.


Comentários

Anônimo disse…
É a primeira vez que vejo uma universitária de medicina poeta, escrevendo em prosa.

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