Um trevo de cinco folhas

Toda vez que chegava naquele colégio, a sensação ao passar pelo portão era a mesma. Pela cor ser vermelha, o portão lembrava de quando estudava no jardim e do desastre que era.

Todos seu colegas da turma o chamavam de "Edwards mãos de tesoura", que inclusive, até um certo tempo ele não entendia o porquê, se a piada era justamente por ele ser a única criança da sala que nao sabia usar uma tesoura, mesmo quando a tia passava a régua e mandava ele seguir.

Depois que nasceu, ficou quase um mês sem nome. A mãe dele não se satisfazia com as sugestões da família, e muito menos tinha criatividade de colocar um nome que não fosse de personagem de novelístico. Assim eu conheci Juvenêncio.

"E isso é nome?" - ele rebatia - "e isso é pergunta?".

Um odiador de convenções, viva do jeito que ele achava que era melhor viver. "As coisas não tem que ser como são só porque já estavam assim antes de você ter nascido", ele dizia no caminho de casa.

Pra tudo que ele escreve usa um espelho, no papel fica só o inverso, "pra ler, aliás, pra entender, tem que ter o reflexo, sacou?". Era meio complicado mas eu sempre sacava.

Me ensinou a medir coisas que não tinha medida/unidade. Ele nao usava relógio, mas era a pessoa que eu conhecia que mais tinha noção de tempo. Nunca chegava atrasado, ai eu descobri que era por causa do papel parede em linhas horizontais de frente pra janela marcavam a luz do sol, e com certas contas, ele sabia quanto tempo gastar no banho.

E antes de sair de casa, ele jogava pra cima a mesma moeda velha, cara ou coroa, e ele via a sorte do dia. Se cara, o dia ia ser ótimo, se coroa, tinha que ser um dia de preparativos pro amanhã. Era engraçado o jeito único que ele olhava as coisas.

Até media a graça da piada pela quantidade de rugas, moral de pessoas em porcentagem, mediu a liberdade também, e tentou me explicar : "é conversão, que nem energia; quando criança você é livre pra fazer o que quiser, ou ficar sem fazer nada, mas depende dos pais, quando o tempo passa, você se livra dos pais mas não pode fazer o que quiser ou ficar sem fazer nada. É uma balança." Ele não gostava quando eu ria.

Pra ele, nada é comum, não existe dia comum, nem pessoas comuns. Cada um carrega certas particularidades e cabe a quem tiver do lado não se meter. Como dizia, "toda rosa é rosa, porque assim ela é chamada. Convenções. Quem foi que inventou isso?"

Enfim, penso com ele e dele, que um trevo de quatro folhas pode até dar sorte, mas um trevo de cinco é muio mais raro.

Comentários

Anônimo disse…
Lindíssimo !!!

Postagens mais visitadas