Mudez

Não era fome, era vontade de comer alguma coisa.

A fila era pequena. Um menino com moedas bem apertadas na mão:
-Quanto custa?

Erguendo uma das sobrancelhas, quase responderam. Um sinal rápido pra evitar frustração e interrompi:
-Primeiro: não custa, vale. Segundo: isso não se pergunta, vale o quanto você trocaria por 7 minutos de paraíso.

Só não riram por ser mais esquisito do que engraçado. Ele entendeu. Começou a pensar numa troca justa. Usou 4m² para sapatear, terminou de braços aberto, o coração cansado:
-Meu melhor. Deu?

-Isso quem te responde é a colher, caro amigo.
Sentados, apresentei passos de se apreciar o paraíso. Normalmente as crianças o deixam escorrer, mas isso porque elas não pagam devidamente o valor que tem. Uma colher pequena e de plástico generosamente ofereceu a porta de entrada e ele até fechou os olhos.

Não fale. Sua língua auxiliando na liquefação de algo tão perfeito não é digna de dizer uma só palavra. O contato é pela via mais óbvia; a boca, tão fácil entrada, tão difícil acesso, mas poucos subordinam o paladar como o paraíso faz, bem assim gelado. Depois de tal, o que poderia atrapalhar plena satisfação era a realidade não permitindo que o fundo do pote fosse ilusão de óptica. Ainda assim, são minutos de prazer puro, sem exageros. O sorvete é discreto.

Comentários

Anônimo disse…
Adorei o Blog e os textos...
Parabéns.
Raísa disse…
uma alma pra tirar as teias de meu blog o/ Não obstante anonimato, agradecida

Postagens mais visitadas